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quinta-feira, 3 de junho de 2010

Sonho Americano ou Pesadelo de um povo?

"(...) A uma distância confortável, poderia imaginar-se que as pessoas que vivem, ano após ano, com um salário de seis a dez dólares por hora descobriram um qualquer estratagema de sobrevivência desconhecido da classe média. Mas não. Não é difícil levar os meus colegas a falarem sobre as suas condições de vida, porque, em quase todos os casos, o problema da habitação é a principal fonte de perturbações das suas vidas, a primeira coisa de que falam quando chegam ao trabalho. Ao fim de uma semana, compilei já o seguinte:

A Gail partilha um quarto num albergue bem conhecido na Baixa por 250 dólares por semana. A pessoa com quem partilha o quarto, um amigo, começou a mexer-lhe com os nervos, a dar-lhe cabo do juízo, mas sozinha ela não poderia pagar a renda.

O Claude, o cozinheiro haitiano, está morto por sair do apartamento de duas assoalhadas que partilha com a namorada e duas outras pessoas estranhas. Ao que julgo, os outros homens haitianos vivem em situações sobrelotadas semelhantes.

A Annete, uma empregada de mesa de vinte anos que está grávida de seis meses e foi abandonada pelo namorado, vive com a mãe, que é empregada dos correios.

A Marianne, que serve os pequenos-almoços, e o namorado pagam 170 dólares por semana por uma caravana para uma só pessoa.

O Billy, que, a dez dólares à hora, é o mais rico de todos, vive numa caravana de que é proprietário, pagando somente 400 dólares por mês de estacionamento.

O outro cozinheiro branco, o Andy, vive no seu barco atracado numa doca seca, que, com base nas suas descrições enlevadas, julgo que não tenha mais de seis metros de comprimento. Convida-me para ir dar uma volta no barco logo que ele esteja consertado, mas o convite é acompanhado por perguntas quanto ao meu estado civil, pelo que não lhe dou seguimento.

A Tina, uma outra empregada de mesa, e o marido pagam 60 dólares por noite por um quarto na residencial Days Inn. Isto é porque não têm carro e a residencial fica relativamente perto do Hearthside. Quando a Marianne é expulsa da sua caravana por a subalugar (o que vai contra as regras do parque de caravanas), deixa o namorado e vai viver com a Tina e o marido.

A Joan, que me tinha enganado com as suas indumentárias numerosas e de bom gosto (as recepcionistas de restaurante vestem as suas próprias roupas), vive numa carrinha estacionada por detrás de um centro comercial à noite e lava-se no quarto de motel da Tina. As roupas são de lojas em segunda mão.(...)"

Excerto de "Salário de Pobreza, Como (não) sobreviver na América" de Barbara Ehrenreich