"(...)A lembrança dela vinha-lhe por surtos, como se tivesse sezões na alma. De repente, sem mais nem menos, invadia-o a cheia irremediável do desejo cruciante de a possuir, de a ver, de trocar nos sentidos exacerbados a imagem pela realidade. A princípio, era diferente. A tentação começava duma maneira insidiosa, sorna, assaltando a fortaleza com vagar e manha. Primeiro as muralhas exteriores; depois, e por cada vez, as portas principais do reduto. O castelo rendia-se, mas com honra. Agora, porém, era uma derrota instantânea. Mal dava conta, estava nas mãos do inimigo. Só quando, exausto, o corpo se relaxava, o fantasma se perdia na bruma, levado pelas mesmas asas que o traziam.
Vencido por essa presença doentia, ficava sem qualquer acção dentro do barco, entregue às forças do pesadelo. (...)"
Miguel Torga, Excerto do conto "Marinha" do livro "Pedras Lavradas"
Miguel Torga, Excerto do conto "Marinha" do livro "Pedras Lavradas"
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