
"(...) nenhuma árvore explica os seus frutos, embora goste que lhos comam. (...)"
Miguel Torga

Terminados os jogos olímpicos ficam duas apreciações minhas:
"Sonhar mais um sonho impossível
Lutar quando é fácil ceder
Vencer o inimigo invencível
Negar quando a regra é vender
Sofrer a tortura implacável
Romper a incabível prisão
Voar num limite improvável
Tocar o inacessível chão
É minha lei, é minha questão
Virar este mundo, cravar este chão
Não me importa saber
Se é terrível demais
Quantas guerras terei que vencer
Por um pouco de paz
E amanhã este chão que eu deixei
Por meu leito e perdão
Por saber que valeu
Delirar e morrer de paixão
E assim, seja lá como for
Vai ter fim a infinita aflição
E o mundo vai ver uma flor
Brotar do impossível chão"
"(...)A lembrança dela vinha-lhe por surtos, como se tivesse sezões na alma. De repente, sem mais nem menos, invadia-o a cheia irremediável do desejo cruciante de a possuir, de a ver, de trocar nos sentidos exacerbados a imagem pela realidade. A princípio, era diferente. A tentação começava duma maneira insidiosa, sorna, assaltando a fortaleza com vagar e manha. Primeiro as muralhas exteriores; depois, e por cada vez, as portas principais do reduto. O castelo rendia-se, mas com honra. Agora, porém, era uma derrota instantânea. Mal dava conta, estava nas mãos do inimigo. Só quando, exausto, o corpo se relaxava, o fantasma se perdia na bruma, levado pelas mesmas asas que o traziam.
"(...)Longe, na praia, do outro lado da grande duna, a faina começara. Um confuso ruído de gritos e de esforço trazia o testemunho de que ninguém renunciara, ali. Mas nenhum exemplo deste mundo lhe poderia valer. O desejo, a palavra ou a presença de alguém só conseguiriam ser naquela hora um motivo a mais de crucificação. A própria lagoa, a olhá-lo com insistência, o alvoroçou no primeiro momento. Mas era a lagoa, a sua velha amiga...(...)"